segunda-feira, 15 de novembro de 2010

O Mito do Apagão de Talentos

Converse com um analista de RH, com um empresário ou com um proeminente executivo de grande empresa por mais de 20 minutos e você ouvirá a expressão do título desta postagem. A pessoa discorrerá sobre como há uma carência de pessoas preparadas no Brasil, sobre como é difícil encontrar bons profissionais para posições que exigem algum preparo, enfim. Ela comentará como há um apagão de talentos, uma falta de pessoas preparadas para crescer e ocupar posições de destaque.

Falarei futuramente sobre a visão dos empresários brasileiros, que é curta. Sobre a insipidez dos profissionais de RH, reduzidos a contratadores e demitidores em série e calculadores de benefícios legais. Sobre a falta de adaptação da alta-gerência à uma nova realidade empresarial, crente que os profissionais do mercado não evoluíram nos últimos anos. Mas neste momento quero focar em como o meio empresarial se apropria de modismos de revista para moldar uma situação alternativa à realidade do mercado. O mais forte dos modismos atuais é culpar o Apagão de Talentos pela inabilidade das empresas em ter bons profissionais nos seus quadros.

A culpa é do mercado
A maioria das empresas, especialmente as grandes, gosta de culpar o mercado por seus próprios problemas. Não conseguir suprir as áreas com trabalhadores de qualidade, em ritmo igual ao de demissões, é algo cuja culpa rapidamente se atribui a terceiros. O próprio ritmo das demissões deveria ser um indicativo de que a “política para retenção de talentos” da empresa tem algum problema. Se somos tão bons em reter talentos porque tantas pessoas vão embora? É uma pergunta que não é feita com a frequência necessária nos departamentos de RH.

Nós não pagamos pouco, não oferecemos poucos benefícios, não temos um nome ruim no mercado profissional como uma empresa que exige demais com metas nem sempre justas. Não. O fato de não conseguirmos contratar novos profissionais com qualidade é porque eles não estão lá fora. É cômodo e fácil colocar a culpa em outra coisa e, assim que a primeira revista “especializada” deu a deixa, todo mundo assim o fez.

Bons profissionais são como bons carros usados
Eles estão lá fora. Mas assim como ao comprar um carro usado, você precisa procurar por eles. A maioria das empresas coloca um anúncio em sites de emprego ou empresas especializadas em “Head Hunting” que é mais ou menos assim:

Gerente de Projetos de Automação.
O profissional será responsável por gerenciar projetos de automação de dispositivos respondendo ao Diretor Industrial pelo andamento, orçamento, e entrega dos projetos afim de manter os equipamentos em funcionamento. Ocasionalmente vai ter de trabalhar até tarde, incluindo em fins de semana, para terminar a implementação de projetos junto à equipe de técnicos industriais. Disponibilidade para viagens é mandatória.

Perfil
Formado em Engenharia. Pós graduação em Gestão de Projetos ou MBA serão considerados diferencial. Experiência de 3 anos é fundamental. Inglês fluente é mandatório.

Benefícios compatíveis com o mercado e remuneração à combinar.

Ora, esse tipo de anúncio de emprego dá muitos indícios sobre a “política de retenção de talentos da empresa”. A empresa quer alguém ultra responsável que irá se reportar diretamente a alguém que facilmente ganha 10 vezes mais que ela, com alguma chance de, em muito tempo, ascender à essa mesma posição (me contive muito para não rir disso). Essa pessoa será responsável por uma função muito importante para o ciclo produtivo que facilmente gera receita de dezenas de vezes sua remuneração total anual. É uma posição bastante importante para o ciclo produtivo do contratante.

Ainda assim, note que a empresa pede alguém com 3 anos de experiência na posição, ou seja, enquanto inglês fluente é mandatório o desejo de evoluir profissionalmente é totalmente opcional. Trabalhar mais de 8 horas por dia é lugar comum e concordar em abrir mão do convívio familiar está implícito. E, por fim, a remuneração à combinar é prova clara de que a pessoa que reúna todas essas condições ainda será paga com o menor salário que seja possível considerando seu rendimento atual e sua vontade de mudar de emprego. Se na entrevista o funcionário mostrar grande descontentamento com seu emprego atual isso reduzirá o valor que a empresa está disposta a pagar ao candidato.

Com tudo isso o responsável pela vaga vai ressaltar que é muito difícil achar profissionais que atendam ao nível de responsabilidade, experiência e requisitos da posição pelo salário que a empresa está disposta a pagar. Está criado o Apagão de Talentos artificial do qual estou falando. Se a vaga citada possuir um salário atraente, em nível daqueles pagos em outros países, garanto que não faltarão profissionais enviando currículos para a empresa.

O problema é que as empresas, ao comprarem seus carros usados, estão procurando veículos com baixa quilometragem, em ótimo estado e com preços baixos. Estão reclamando que não estão encontrando o que querem. É como aquelas solteiras de 40 anos que não queriam nada mais do que um homem bonito, educado, elegante, com dinheiro e que fosse fiel. Não encontram o que desejam porque suas exigências estão altas demais em relação ao que oferecem em troca.

Prova dos Nove
Eu já pensava muito sobre isso simplesmente observando o mercado de trabalho em Florianópolis, cidade onde vivo. Como já trabalhei em São Paulo e em Curitiba tenho uma perspectiva privilegiada. Já pude observar processos de contratação de grandes multinacionais que possuem referência nos salários que pagam à seus funcionários em outros países e portanto toleram pagar mais à seus empregados no Brasil. Como Florianópolis tem um número de grandes empresas estrangeiras (GEEs) menor do que outras capitais do Sul e Sudeste tem também a menor média salarial destas duas regiões.

Diferente de empresas locais, que sempre se preocupam em pagar o menor salário possível aos contratados, as empresas multinacionais normalmente possuem tabelas de valores-base para posições importantes na cadeia de negócios. Isso faz com que um mercado local pequeno, como o de Florianópolis, jogue luzes nesse tipo de diferença. Vou ilustrar com um exemplo. Em Florianópolis é fácil encontrar gerentes de contas PJ de bancos que ganham, com 5 anos de experiência na função, US$2,5mil/mês ou US$30.000 por ano para administrar carteiras que giram 10 ou 20 milhões de dólares/mês. É uma remuneração baixa para o nível de responsabilidade da função e não por acaso os bancos encontram dificuldades em recrutar profissionais para estas posições na região. Sei de vagas que estão abertas há quase 8 meses e ainda sem previsão de contratação. Em contra-partida, já vi anúncios de gerentes de controladoria de empresas em São Paulo que pagam US$55.000 por ano exigindo o mesmo nível de experiência que a posição de gerente de banco. E eu entendo que as responsabilidades envolvidas na controladoria são menores simplesmente porque você tem apenas um patrão a quem prestar contas, enquanto na gerência de contas você é cobrado por duas partes que possuem interesses quase sempre contrapostos.

Fato que este é apenas um indício de que os baixos salários em relação às exigências das vagas faz os profissionais escassearem. Entretanto há uma prova. O Google Brasil reporta receber mais de 1200 currículos todos os meses de pessoas interessadas em trabalhar em um de seus escritórios e pode, com todas as letras, escolher quem contratar. O contraste em relação ao banco que tem a vaga aberta por 8 meses é a materialização da cultura corporativa e a forma como a empresa olha para os funcionários. Voltarei nisso em um instante.

O Google faz coisas de forma diferente, até na área de recursos humanos. Um funcionário recebe um prêmio de até R$5mil quando uma indicação sua vira contratação. No Natal de 2009 cada funcionário da empresa recebeu de presente o smartphone que o Google vende, o NexusOne. Pense sobre a última coisa que você ganhou do seu empregador. Entendeu porque o Google consegue ter uma fila de pessoas se candidatando todos os dias?

Como ver o funcionário
Empresas criativas vêem o funcionário como um agente de novas idéias. Fala-se muito no discurso corporativo sobre o valor que as idéias tem (lembre do slogan do Santander...) e sua importância para os negócios. E se a empresa precisa de idéias para usar como combustível da inovação os funcionários ganham valor. Não há muitas empresas assim no Brasil pois elas estão em um novo pedaço da economia capitalista que ainda não floresceu por aqui.

As empresas da economia tradicional muitas vezes olham para as pessoas apenas como partes de suas estruturas, complementos dos processos. E como tal, podem entender que muitas vezes eles atrapalham o funcionamento dos processos e precisam ser substituídos por pessoas que se adaptem melhor ao jeito como as coisas são feitas. Ao contratar procuram pessoas que irão se encaixar à esse perfil e traduzem isso em demandas exageradas por habilidades e experiência.

Por exemplo, uma empresa que demande grande tempo de experiência em uma função relativamente simples sinaliza, antes mesmo da contratação, que não vai dar treinamento para os funcionários e que não vai se preocupar em patrocinar cursos, pós graduações ou outras formas de evolução profissional. Digo de antemão que qualquer empresa que demande experiência maior do que 6 meses para qualquer posição de analista não está comprometida com a evolução profissional do funcionário. A disposição para ensinar é a característica mais importante de um professor. Uma empresa que deseja gente pronta, que entre no jogo jogando, não está comprometida com a evolução profissional. Portanto não vai saber valorizar (com dinheiro e não cartões de natal decorados) profissionais com perfil mais completo.

Ausência de métricas
O mais interessante é que o mundo corporativo adora números, siglas e métricas, mas nunca ninguém criou nada para parametrizar a forma como os funcionários são remunerados por suas atividades. Mesmo tendo uma sigla e um índice para cada linha dos seus balancetes corporativos as empresas não dispõe de uma métrica para que seus funcionários possam avaliar se estão sendo pagos bem proporcionalmente à seus pares ou colegas de outras empresas. Como saber então se você está sendo pago justamente pelo trabalho que está desempenhando?

Estranhamente os salários são tratados de forma super confidencial, ainda que o balanço e ou caixa das empresas sejam até publicados em jornais para que todos possam ver. O segredo aqui é mantido por razão simples, para que a empresa pague a cada um o mínimo possível para que ele desempenhe sua função. Se você descobre que alguém que faz a mesma coisa que você ganha 30% a mais a primeira providência é pedir um aumento. Ocultar essa informação é essencial para que as empresas possam continuar funcionando e pagando aos seus proprietários valores cada vez mais altos. Nada contra isso e contra o capitalismo, muito pelo contrário. Mas a falta de transparência nesta questão contrasta com todo o blá-blá-blá corporativo sobre meritocracia e reconhecimento de valor das pessoas. Em um ambiente realmente meritocrático não haveria problema se todos os funcionários soubessem o salário do chefe. Seria até um incentivo a buscar trabalhar mais e mais em vista de uma promoção.

Isso só não funciona bem em dois casos específicos:
1- O salário do chefe não é tão bom frente à responsabilidade que ele tem, e saber esse valor traria um revés aos ânimos da equipe. Essa situação costuma ocorrer no chão de fábrica das indústrias;
2- O salário do chefe é muito alto em relação ao salário da equipe e desproporcional em relação à carga de cobranças e responsabilidades individuais, e isso causa insatisfação à equipe que entende que alguém que não trabalha tanto ganha muito mais. Essa situação costuma ocorrer nas empresas de serviços a partir da média gerência.

Pela falta de um parâmetro o profissional precisa basear-se em sua própria carreira e o modelo que eu adoto é medir o quanto ganho para cada ano que estudei. Em tese eu devo conseguir aumentar o valor por ano de estudo a medida que minha carreira progride. Assim, ao me formar na faculdade eu tinha estudado por 18 anos (da primeira série até o quinto ano de faculdade com mais 3 de secundário) e ganhava US$94,28/mês para cada ano de estudo. Hoje estou com 19,5 anos de estudo e ganho US$133,64/mês para cada ano de estudo. Se eu decidir fazer um MBA de 18 meses preciso de um aumento real de salário de 7,6% apenas para que o investimento no MBA valha a pena.

Essa métrica é interessante pois vai permitir que você compare sua remuneração com seus colegas de função, caso você saiba o salário e tempo de estudo deles. Mas não vai funcionar para comparar sua função com outras posições. E nesse aspecto você precisa desenvolver sua própria percepção de salário/responsabilidade para cada posição de sua empresa.

Voltando ao Apagão
Sobre o apagão fictício de talentos que estamos vivendo eu defendo que as empresas têm pecado e oferecido remunerações muito tímidas para vagas que exigem pessoas muito qualificadas e dispostas a enfrentar grandes responsabilidades. Conheço dezenas de profissionais muito qualificados que não se sentem atraídos pela maioria das vagas que aparecem em seus e-mails porque não estão confortáveis com a idéia de trocar de emprego para ganhar 300 ou 400 reais a mais por mês.

Grande parte dessa questão está ligada à quantidade de informação que as pessoas recebem sobre empresas como o Google, citado anteriormente. Claro que nem todas as empresas pode pagar remunerações como o Google e portanto terão que se contentar com profissionais de nível mais baixo, por assim dizer. E aí surge outro problema. No momento de definir os critérios para as vagas as empresas definem padrões muito altos, acima da realidade para os salários que estão dispostos a pagar. Vagas com experiência de 4 anos e inglês fluente, mas com salários de R$2500,00 são comuns e, sinceramente, fora da realidade.

Completa o quadro a globalização. Ela própria que equalizou os preços de commodities no mundo todo. As empresas não perceberam que, em um mundo globalizado, a mão de obra, mesmo a especializada, é uma commodity como a soja, o minério de ferro e o petróleo. Os salários da alta-gerência e diretoria das empresas brasileiras já são equivalentes aos pagos nos EUA e Europa, mesmo de empresas médias e pequenas. Porque esses profissionais dispõe da possibilidade de ser empregados por empresas para trabalhar offshore. Profissionais de média gerência e segundo escalão estão experimentando o dessabor de desempenharem, em multinacionais, funções equivalentes ao de colegas de outros países e receberem uma fração apenas do que aqueles ganham.

Ao avaliar que o Itaú Unibanco é o banco com maior lucro líquido absoluto do continente no 1S2010, incluíndo seus competidores dos EUA, não se pode esquecer que um gerente do Itaú ganha cerca de 1/4 do que um gerente do Bank of America nos EUA. Inclua na análise que durante a fusão entre Itaú e Unibanco os funcionários ficaram por 2 anos com suas remunerações congeladas (sem que nenhuma promoção ou ação de mérito pudesse ser efetuada) e fica fácil entender de onde vem a lucratividade do banco. É fácil ser a empresa mais lucrativa do segmento no hemisfério se seus funcionários são sub-pagos e você fica 24 meses sem dar um único aumento.

Entretanto, como isso afeta a satisfação dos funcionários, e o blá-blá-blá corporativo sobre ser feliz no trabalho? Não muito, desde que seus concorrentes também se esforcem para pagar o menor valor possível para cargos que exigem conhecimento profundo sobre finanças, certificação das autoridades competentes e uma grande dose de responsabilidade.

Entretanto quanto seus melhores funcionários começam a receber propostas de outros segmentos da economia você precisa justificar o fato de não conseguir repor seus quadros com funcionários tão competentes quanto aqueles que possuíam experiência na casa. Há a resposta certa e a resposta fácil. E o Apagão de Talentos é novamente citado.

10 comentários:

  1. Fábio, Toda vez que leio um artigo seu aprendo muita coisa, e me transformo. Durante a leitura fiz três pausas:

    1 - Adicionar o feed ao meu google reader
    2 - Compartilhar no google reader (já vai pro twitter)
    3 - salvar o link no delícios

    Acho que podería-mos extender a questão para a qualidade de vida. Eu prefiro ganhar muito pouco e ter tempo livre. Pessoalmente tempo livre vale muito, pois com tempo disponível posso fazer muita coisa, dentre as quais: Ler bons artigos como este, estudar mais bash, vim, linux, kung fu, cultura, enfim (ter tempo para a vida). Valeu!

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  2. Dois fatores que podem ainda ser considerados neste seu excelente artigo:

    1) Tributação.

    Todo mundo sabe que a tributação sobre salários CLT é incrivelmente alta. Um funcionário CLT tem de produzir no mínimo duas vezes o que ganha apenas para se pagar. Isto limita automaticamente o salário CLT a 50% do que poderia ser, embora algumas pessoas considerem que um salário CLT também "Vale o dobro" do que uma remuneração como PJ por vantagens como seguro-saúde e outras.

    Agora, por que os empresaários não brigam mais para diminuir esta carga? Porque não precisam, ou acham que não precisam.

    Um amigo meu, empresário, e neolulista (portanto acha que pagar imposto "ajuda o Lula") alegou que impostos sobre salário não são problema dele, pois diminuem unicamente o salário do empregado, não aumentam o custo dele.

    Aí, no outro dia, ele vem se queixar porque não acha boa mão-de-obra, ou porque os funcionários que ele "formou" resolvem trabalhar remoto para empresas estrangeiras. E isto limita o crescimento dele, pois não consegue reter a mão-de-obra suficientemente forte para dar o próximo passo. E o mercado a quem ele serve neste momento tende a ser engolido pelo cloud computing. Então, o problema também é dele :)

    É como se diz, "um hospital para pobres acaba virando um hospital pobre". A CLT foi feita para proteger empregados bobalhões e o resultado é que apenas restam os funcionários bobalhões.

    2) Cultura fechada

    Um fator adicional no Brasil é que somos uma cultura fechada. Em qualquer outro país, incluindo grotões como Paquistão, quando o sujeito sente que está sendo limitado pelo mercado local, ele se muda, de cidade ou de país.

    Nós brasileiros (e estou humildemente me incluindo neste grupo, porque é o que eu sou, e é como um que eu ajo) aparentemente resistimos mais a isso, insistimos, por ufanismo, preguiça, senso de lealdade, medo do estrangeiro ou sabe Deus por quê mais, a "votar com nossos pés", fazer o mercado funcionar e dar no pé em busca de pastagem mais verde.

    Na área de informática a ascenção do trabalho remoto mitiga este problema, mas ainda se vê muitos e muitos profissionais da área sem saber falar inglês, novamente por uma mistura de ufanismo, preguiça e visão paroquial, e nem mesmo esta opção lhes é viável.

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  3. Você colocaria o custo de vida no local de trabalho como parte da remuneração?

    Ex: Com U$ 90k ano um gerente vive bem nos EUA, mas não viveria muito bem em Londres, etc...

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  4. @voyeg3r
    Obrigado pelos elogios! Eu também pensei isso por muito tempo. Entretanto, depois de mulher e filhos, ganhar menos para ter mais tempo livre vai deixando de ser opção. Acabo me obrigando a ter um valor mínimo de salário que preciso buscar, e tenho que conceder coisas para isso. Muitas vezes essas conceções são caras :-)

    @EPx
    Também agradeço pelos elogios. Você está correto. A CLT é um "pedágio" que a sociedade brasileira cobra do trabalhador e do empresário (indiretamente também do consumidor final) que precisa ser repensado. Eu mesmo abro mão de contribuir com o INSS e com o FGTS assim que houver oportunidade. Pois pago plano de saúde e seguro de vida em grupo e sei que o dinheiro do FGTS estaria mais bem aplicado se viesse para mim todo mês. Ao optar por ser PJ ou autônomo a coisa não muda muito. Você não paga encargos sociais, mas paga vários impostos que não pagaria como funcionário. Sem contar que ser PJ não significa que seus ganhos dobrarão. O contratante vai tentar morder o máximo possível dessa diferença para ele próprio.

    Reformar a legislação trabalhista é fundamental para mudar o padrão de vida da classe média brasileira. O difícil é ver um governo brasileiro fazer isso.

    Com relação ao seu outro ponto, novamente concordo 100%. Conheço dezenas de profissionais aqui em Florianópolis que estão insatisfeitos com seus ganhos e poderiam dobrar o salário mudando-se para o Rio ou São Paulo. Mas não querem praia e sol depois da aposentadoria. Querem agora e vão pagar o preço profissional por isso.

    @Danilo Cesar
    Sim, o custo de vida da cidade deve compor sua avaliação de sua remuneração. Um amigo meu ganha o mesmo salário bruto que eu, entretanto ele mora em cidades pequenas, normalmente acompanhando obras civis. Além de pagar bem menos por comida e moradia ele ainda recebe, por tolerar morar em cidades que não possuem teatro ou cinema, por exemplo, ajuda de custo para o automóvel e conta de celular. Isso faz com que seu rendimento líquido seja 30% maior que o meu. Ou seja, mesmo com o mesmo valor bruto, no fim das contas ele tem mais dinheiro para viver.

    Por isso que um profissional deve pesquisar e pesar o custo de vida quando estiver pensando em mudar. Aprendi isso à duras penas. Mudei de São Paulo para Florianópolis em 2008 achando que os 20% de aumento bruto que recebi era um grande negócio. Estava errado. O custo de vida de Floripa, uma cidade turística onde tudo é muito caro, é muito mais alto que o de São Paulo e consumiu todo o aumento que recebi me deixando exatamente como eu estava antes da promoção e do aumento. Foi ruim.

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  5. Fábio, muito interessante o artigo!

    Vivo na pele uma empresa que somente quer "sugar" - onde não há nenhuma perspectiva de crescimento (seja com promoções ou cursos bancados pela empresa) nem "política" de salários. O bem estar do colaborador é cada vez mais ignorado, tenho que "bater" ponto até na hora do almoço! (Só falta tornozeleira com localizador rsss)

    Acredito também que o que foi dito por você se aplica diretamente no mercado de TI, onde vejo diversas empresas buscando profissionais e dizendo que não encontram. Por outro lado querem um profissional ultra qualificado por uma merreca.

    Fica aí meus 2 cents ;)

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  6. @Marcelo
    Essa é a situação mais comum: precisamos de alguém muito bom, mas queremos e vamos pagar pouco porque existem dezenas de pessoas sem emprego que adorariam estar nesta vaga.

    Olha a contradição do modelo: existem dezenas de profissionais disponíveis a ponto de baixar o valor dos salários, mas vivemos um "apagão de talentos"?!

    Se o "apagão de talentos" fosse verdade veríamos uma verdadeira guerra salarial entre as empresas. Entretanto vejo bons profissionais recebendo salários medianos todos os dias, em dezenas de empresas, de vários segmentos da economia distintos.

    Conheço um profissional de ótimo nível que foi dispensado de uma empresa de primeira linha e substituído por um trainee que recebe 1/4 do seu salário. Não dá pra falar em apagão em um mercado onde isso ocorre. Neste mesmo segmento uma empresa contratava um analista que deveria ter 2 anos de experiência na função. O salário era de R$2.500,00 bruto e a função envolve responsabilidades como formalização de contratos que podem chegar a R$2 milhões.

    Não dá pra esperar que para este salário e esta responsabilidade apareça um cara genial formado no MIT não é mesmo? Mas os gestores, após as entrevistas, criticavam o preparo dos candidados: não é possível não ter morado no exterior... Morado no exterior como, com 2 anos de experiência em um emprego que pagava menos de R$2.500???

    Vou falar disso em breve. Mas o fato é que a empresa procura um cara talentoso, pra pagar para ele menos do que a prestação do barco do dono da empresa.

    Qualquer empresa que anuncie no jornal: Procuro talentos, pago o que for preciso vai descobrir que pode-se contratar quanta gente boa quanto se queira. E isso não mostra que existe um apagão. Mostra que a economia está desajustada em relação ao valor (e não ao preço) da mão de obra especializada.

    Quem quer mão de obra barata tem que ir pra China. Aqui trabalhamos 4 meses do ano apenas para pagar impostos e ainda assim precisamos de dinheiro pra viver.

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  7. Excelente artigo. Em Portugal passa-se o mesmo

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  8. Excelente artigo! Mais uma opinião relacionada ao tema:

    Na área de Computação, de mogo geral, empresas brasileiras não estão preparadas para absorver mestres e doutores. Quando estes profissionais vão procurar emprego em empresas nacionais, frequentemente ouvem coisas do tipo: "Precisamos de algúem com mais experiência", "você é muito qualificado para a vaga", "desculpe-me, seu perfil é muito acadêmico", "infelizmente, não trabalhamos com pesquisa", "podemos até te contratar, como programador JAVA JR/PL".


    Pois é, não por acaso, vários pesquisadores brasileiros trabalham no exterior ou multinacionais sediadas no Brasil. Nós, brasileiros, já estamos acostumados a consumir soluções, padrões, especificações, tecnologias, importar consultorias, etc. Corremos atrás do que já está em uso há alguns anos lá fora para tentar implementar aqui dentro. E sabe quem dita estas tendências? Bom, tenha certeza de uma coisa: tem brasileiros metido nisso - aqueles caras qualificados que um dia foram dispensados (e são muitos viu!).

    Aliás, já viram o quadro de vagas de empresas como Google, IBM, GE, Facebook, há vagas mais ou menos assim: Qualificação Mínima Exigida - Mestrado ou Doutorado em Ciências da Computação com ênfase em Engenharia de Software, por exemplo.

    Resultado: ou nossos mestres e doutores ficam em universidades nacionais sem conversar com empresas, sem diálogos (porque isso também não há); vão trabalhar como implementadores, de certa forma, mais restritos no que tange à elaboração de soluções para problemas diversos (afinal, propor soluções é uma habilidade que mestres e doutores, sem dúvidas, tem); ou, finalmente, vão para fora do país.

    É isso aí Brasil para que apostar em pesquisa e desenvolvimento? É bem mais fácil divulgar mais matérias sobre "Carência de bons gestores em TI", "Carência de RH qualificado em TI", ops, desculpe-me, quero dizer "Gestores e RH reclamam da carência de mão de obra qualificada em TI"!

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  9. Mto bom artigo, parabens!!
    Uma coisa q sempre escuto na empresa onde trabalho eh q cada um eh responsavel pelo seu proprio desenvolvimento.
    O que pensa disso??
    Posso ateh concordar com isso, agora outro problema q vejo eh a falta de oportunidade dentro das empresas. Se eles nao pagarem treinamentos, estudos, vc nao tem pq exigir alguma promocao e para eles isso eh otimo, eles terao uma pessoa qualificada ganhando pouco e com cada vez mais responsabilidades...

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